quarta-feira, setembro 14, 2005
Algumas reflexões sobre teatro- Cecchi,García e João Garcia Miguel
Nos últimos dias assisti a três espectàculos/exercícios teatrais.
A actividade crítica ,enquanto exercício de reflexão ,e sobretudo de contestação é sempre alvo de demasiadas susceptibilidades.
Sobretudo se parte de um interveniente, que é então facilmente acusado de parcialidade e falta de isenção.
Eu,que defendo acerradamente a ideia de que somos produto de um mapa de afinidades electivas; e que isenção e parcialidade,são metáforas verbais( não somos inócuos a nada,nem a nínguem) resolvi então fazer algumas observações sobre os espectáculos assistidos nos últimos dias, a saber: "Sonho de Uma Noite de Verão"- Carlo Cecchi ; " ,Levantem a cabeça do chão,seuscabrões"-Rodrigo García e "1.Parto"- João Garcia Miguel.
Os três trabalhos têm como denominadores comuns,:serem realizados com jovens atores( os dois primeiros inseridos no projeto Thierry Salmon,que já mencionamos previamente) e o ùltimo como projeto final dos alunos do quarto ano da ESMAE(escola superior de música e artes do espectáculo).
Os alunos da Esmae,ao findarem o quarto ano dividem-se em grupos, e organizam um projeto profissional com um encenador de sua escolha( reforçe-se a importância desta escolha,como defesa de uma estética teatral, dado que até então,trabalham com varíos encenadores,de diversos modos,sendo esta a primeira decisão perante o mercado de trabalho, de um modus operandi); os alunos do Thierry Salmon, são selecionados e dividem-se em dois grupos de trabalho,com dois mestres da cena teatral contemporânea.
A apresentação de Carlo Cecchi,nome eminente do teatro e do cinema italiano,foi lúdica,agradável, simples ,assentando na ideia de "jogo dramático" e "trabalho de actor" .
Os actores, actuavam num palco ,onde estavam também as cerca de 80 pessoas que puderam assistir, dispostas sob a forma de meia-lua.
O cenário era delimitado por um globo,feito de fita adesiva branca,com vàrias cartolinas coloridas dispostas no centro ( a ideia circunférica evoca o antigo Globe,espaço shakesperiano por excelência).
Os atores brincam com a "babel" de línguas ,expondo incorreções ,trejeitos e enunciações típicas dos vários paìses ( o próprio Carlo Cecchi o fez ,com o portugês).
O espectáculo,parece no entanto,querer recusar esse epíteto ,e sob o pretexto de se tratar de um "Curso Intensivo de Formação Teatral" insiste em apresentar-se como um exercício lúdico, das regras elementares de apresentação do ator em cena.
Fica a desilusão, de não termos tido a oportunidade de testemunhar um trabalho mais autoral da parte de Carlo Cecchi,um dos grandes "prosadores" do teatro atual,com uma marca inequívoca.
"Levantem a cabeça do chão,seus cabrões"-vinha envolto sob a àurea de expectativa que acompanha o trabalho de Rodrigo García,fundador da "La Carnicería Teatro".
O enfant terrible da cena espanhola,que a França descobriu e apadrinhou frequentemente( assim como o Citemor- festival de Montemor-o-Velho,onde é presença assídua)abordou ao longo de quase 2h e 30m(!)temas caros ao mesmo: globalização,a anestesia da cultura de massas, o terrorismo, a intolerância, o medo face ao "outro".
Num trabalho político, profundamente incómodo , este trabalho bombardeava o espectador com imagens,ruídos,choque mas sobretudo inquietações,muitas ...
Outra nota positiva: os atores tiveram ,um papel importante na criação deste espectáculo,onde se nota a marca de cada um ( não há como não realçar o magnífico trabalho de Nuno Lopes)e no entanto, fruto de horas de improvisação e liberdade( e um caos aparente e constante) encontra-se um espectáculo,acabado,formalizado, e dirigido a uma plateia específica ( ao contrário de Carlo Cecchi, as frases eram disparadas em portugês " Entregar-se a àlguem é estúpido" "Pedir ajuda traz problemas").
Um nome a reter na cena atual.
Por fim,o espectáculo de João Garcia Miguel com os alunos do quarto ano da Esmae ( um dos núcleos,conforme explicamos anteriormente) a partir de Strindberg.
O trabalho apresenta-se como Parto - textos de João Garcia Miguel a partir de Strindberg.
O espectáculo,falho em todos os apectos,tem logo como premissa esta falácia " a partir de Strindberg".
O espectáculo em nada convoca o universo de August Strindberg,podendo mesmo dizer-se que coloca-se na antítese do mesmo.
Aqui , acolá pontuam frases dispersas de Strindberg,mastigadas,ruminadas em meio a palavrões,e descobertas sexuais constantes dos intérpretes .
Num projeto que anuncia a fantasmagoria de personagens á espera do parto do seu autor( Strindberg)tudo é pulsão,sémên,carne e músculos...não existe poesia,nem metáfora,nem inquietação... nada é explorado até à exaustão..após quadros inconsequentes e desconexos, o espectáculo remata com um quadro burlesco, de mau gosto ,com óbvia inspiração no humor "batanetes" ou "malucos do riso"; e que no seu momento mais alto, é uma cópia ( esbatida) da brilhante sátira conseguida por Ricardo Pais em Ubus ao folclore nacional( entre outras coisas).
Este enfant terrible da cena nacional nunca me convenceu.
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2 comentários:
Palavras acertadas! dito por uma pessoa que esteve ao teu lado no Rivoli, no "Levantem a cabeça...".
é só pra saberes quem eu sou!
No trb da Esmae, é difícil pra mim, mas concordo, pk a encenação, o trb dos actores não me convenceram, embora possa dizer que há intérpretes com boa qualidade, pk os conheço de outros trbs. O que falhou foi mesmo a direcção, sentiu-se que o João Garcia Miguel os deixou a naufragar naquele líquido amniótico que protege e alimenta os bebés. Direi então que se tratou de 1parto prematuro!
bj. Prá semana há novidades! Estou quase a ir-me embora de... sabes bem! é só até quarta. Depois, na outra semana ligo-te e vamos ao tal bar falar com o tal sr. a ver se fazemos um trb interessante juntos. Bj grd!
gostei de ver por cá:) fico à espera das novidades e do trabalho.beijo
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